Marcelo Coelho
Quando se fala em "bate-boca", a
impressão é que todos os envolvidos são desequilibrados ou perderam o controle.
Se houve "bate-boca" na sessão de
ontem do Supremo, a responsabilidade coube exclusivamente ao relator do
mensalão, Joaquim Barbosa.
Podemos admirar muito a minúcia com que ele
analisa o escândalo e concordar com todos os seus votos.
Mas traços desagradabilíssimos da sua
personalidade confirmaram-se ontem. Qualquer pessoa, no lugar de Ricardo
Lewandowski, teria reagido de forma muito mais violenta do que ele ao ser
atacado como foi.
Lewandowski começou tratando de duas acusadas
do crime de lavagem de dinheiro, cuja situação, disse, era completamente
diferente da dos outros réus. Ou seja, anunciava que iria condenar muita gente
no final de seu voto.
Ayanna Tenório já tinha sido absolvida na
segunda-feira. O problema era Geiza Dias, funcionária da SMPB, agência de
Marcos Valério.
Tratava-se, disse Lewandowski, de personagem
menor, subalterna, "transeunte" nos feitos da organização. Era ela
quem informava, junto ao Banco Rural, o nome das pessoas que iriam sacar os
cheques emitidos por Marcos Valério.
Lewandowski distribui cópias da carteira
trabalhista de Geiza: ela ganhava cerca de R$ 1.500 mensais.
Pouco, para um crime tão sofisticado como o
de lavagem de dinheiro. Leem-se trechos da correspondência eletrônica entre
Geiza e funcionários do Banco Rural. Terminavam com abraços e beijinhos.
Conclusão de Lewandowski: havia certa
"candura" da parte de Geiza, mandando esses emails, sem ocultar nada.
"Candura": o termo incluía uma
provocaçãozinha amigável. Joaquim Barbosa já tinha estrilado quando o revisor
usou a palavra em outra absolvição.
Tudo bem. Foi quando Lewandowski soltou o
raciocínio fatal. Era importante ver o lado dos advogados, afirmou, porque é
disso que se fala quando se requer a presença do "contraditório" no
processo.
Barbosa interrompeu. "Vossa Excelência
está insinuando que não levo em conta o contraditório no meu voto?" A
pergunta não tinha razão de ser. Mas Barbosa foi daí para pior: reclamou de
outros comentários de Lewandowski sobre o andamento "heterodoxo" do
julgamento e pediu que ele se ativesse ao próprio voto, emitindo-o "de
forma sóbria".
Como assim? Não estou sendo sóbrio? A reação
de Lewandowski se fez sem elevar a voz. Explicou que estava dizendo isso apenas
em atenção aos estudantes de direito que visitavam o tribunal etc...
Não era o lugar para preocupações acadêmicas,
insistiu Barbosa. Houve panos quentes de Celso de Mello e Ayres Britto. Sempre
fofinho, Lewandowski ainda disse que estava aprendendo com todos os votos, tal
e coisa.
Barbosa continua, insaciável: todos temos suficiente
saber para dar nosso julgamento.
Sem dúvida. Não falta saber, nem falta rigor,
a Barbosa. Mas falta um mínimo de tranquilidade e disposição para não ver
intenções malignas a todo instante. Qualquer hora, sentencia Lewandowski a
vários anos de prisão também.
Publicado na Folha de S.Paulo, em
13/09/2012.
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