quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Fazendo o certo

Kenneth Maxwell


O presidente Franklin Delano Roosevelt supostamente teria dito, em 1936, sobre Anastasio Somoza, por muito tempo ditador da Nicarágua, que "Somoza pode ser um filho da puta, mas é o nosso filho da puta".

Na verdade, parece mais provável que Somoza, e não Roosevelt, tenha dado origem a esse mito, embora a frase tenha a virtude de sumarizar a política de Roosevelt com relação à América Latina.

Mais tarde, durante a Guerra Fria, essa postura se tornou comum no aparelho de política externa dos Estados Unidos. Diplomatas e empresários norte-americanos preferiam fortemente os governantes latino-americanos, e de outras regiões do mundo, que sabiam de que lado deveriam estar tanto nas questões internas quanto nas internacionais.

Com a queda dos regimes comunistas da Europa oriental, nos anos 90, porém, a única região do mundo sobre a qual persistiram opiniões desse tipo foi o Oriente Médio, e Hosni Mubarak serve como exemplo clássico.

A justificativa de Barack Obama para manter seu apoio a Mubarak até o fim é notavelmente semelhante à opinião de Roosevelt sobre Somoza, ainda que os EUA tenham muito mais em jogo no Egito.

Mubarak foi presidente do Egito por quase 30 anos, depois de suceder Anwar El Sadat, assassinado em 1981, e governou ao longo dos mandatos de cinco presidentes norte-americanos, de Reagan a Obama, passando por Bush pai, Clinton e Bush filho.

Era visto como um baluarte dos interesses norte-americanos e como fiel da paz com Israel. Auxiliou os Estados Unidos na primeira Guerra do Golfo Pérsico e na reconquista do Kuwait depois da invasão do país pelo Iraque de Saddam Hussein. Como resultado, o Egito teve US$ 14 bilhões em dívidas perdoadas pelos Estados Unidos e pela Europa.

O Egito continua a receber assistência militar norte-americana maciça.

Mas o resultado foi a falta de mudanças políticas no Egito.

E esse foi um preço pesado a pagar. Os acordos de paz entre Israel e os palestinos malograram. E Israel fica cada vez mais duro e oposto de qualquer modificação real na sua política de expansão de assentamentos dentro do território palestino. Era como se todos os envolvidos tivessem tempo ilimitado. Mas a lição da história é que o tempo não para.

Ninguém sabe quais serão as consequências das revoluções populares que varrem o Oriente Médio. A esperança é a de um futuro mais democrático, mais aberto e mais esclarecido. Uma coisa é certa: caso isso aconteça, não terá sido graças àqueles que passaram 30 anos percorrendo o caminho da conveniência, nos Estados Unidos.

* Publicado na Folha de S.Paulo, em 17/02/2011.

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