Vladimir Safatle
Há várias
maneiras de esconder um elefante. Uma delas é apresentando suas partes em
separado. Em um dia, aparece a pata. No dia seguinte, você mostra a tromba.
Passa um tempo e vem a cauda. No fim, não se mostra o elefante, mas uma
sequência de partes desconectadas.
Desde o
início, o mensalão foi apresentado pela grande maioria dos veículos da imprensa
nacional dessa maneira. Vários se deleitaram em mostrá-lo como um caso de
corrupção que deixaria evidente a maneira com que o PT, até então paladino da
ética, havia assegurado maioria parlamentar na base da compra de votos e da
corrupção. No entanto o mensalão era muito mais do que isso.
Na
verdade, ele mostrava como a democracia brasileira só funcionava com uma grande
parte de seus processos ocultados pelas sombras. O jogo ilícito de
financiamento de campanha e de uso das benesses do Estado deixava evidente como
nossa democracia caminhava para ser uma plutocracia, independentemente dos
partidos no poder.
Como a Folha
mostrou em uma entrevista antológica, o então presidente do maior partido da
oposição, o senador Eduardo Azeredo, havia sido um dos idealizadores desse
esquema, que, como ele mesmo afirmou, não foi usado apenas para sua campanha
estadual, mas para arrecadar fundos para a campanha presidencial de seu
partido.
Não por
acaso, o operador chave do esquema, o publicitário Marcos Valério, já tinha
várias contas de publicidade no governo FHC. Ninguém acredita que foi graças à
sua competência profissional.
Ou seja,
a partir do mensalão, ficou claro como o Brasil era um país no qual a
característica fundamental dos escândalos de corrupção é envolver todos os
grandes partidos.
Mas, em
vez de essa situação nos mobilizar para exigir mudanças estruturais na política
brasileira (como financiamento público de campanha, reformas que permitissem ao
partido vencedor constituir mais facilmente maiorias no Congresso, proibição de
contratos do Estado com agências de publicidade etc.), ela serve atualmente
apenas para simpatizantes de um partido jogar nas costas do outro a conta do
"maior caso de corrupção do pais".
No
entanto essa conta deve ser paga por mais gente do que os réus arrolados no
caso do mensalão. O STF teria feito um serviço ao Brasil se colocasse os
acusados do PT e do PSDB na mesma barra do tribunal. Que fossem todos juntos!
Desta
forma, o povo brasileiro poderia ver o elefante inteiro. Com o elefante, o
verdadeiro problema apareceria e a indignação com a corrupção, enfim, teria
alguma utilidade concreta.
Publicado na Folha de S.Paulo, em 07/08/2012.
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