Janio de Freitas
Nem
Joaquim Barbosa nem Ricardo Lewandowski. Nem a ânsia de condenação a granel nem
a absolvição seletiva. Nem as suposições forçadas nem o escamoteio de
evidências. Julgamento é outra coisa. Ou deve ser.
A origem
fraudulenta do dinheiro repassado a políticos, como pessoas ou em nome dos seus
partidos, está demonstrada com provas suficientes. A imprecisão do montante
destinado aos repasses, pelo PT, não diminui a obviedade, também demonstrada,
de que Delúbio Soares não agiu por decisão própria para tomar os empréstimos e
para distribuí-los. Pois o próprio presidente do partido, José Genoino,
avalizou um dos empréstimos e, também não há dúvida, as relações do comando
petista com deputados e partidos eram influenciadas pelas quitações de dívidas
ou, dizem as condenações, compras de votos na Câmara.
Os
repasses conhecidos de dinheiro tinham essa precisa finalidade de influir nos relacionamentos
políticos do PT. Finalidade que não conta, no processo, com provas da maneira
como se tenha efetivado. A rigor, tais provas não seriam necessárias para haver
consequências judiciais, para isso bastando os repasses de dinheiro com origem
fraudulenta.
Mas a
acusação quis atribuir um objetivo definido --indicou a compra de votos em
apoio a projetos do governo--, para assim chegar à acusação maior a José
Dirceu. Tanto o relator como ministros do Supremo Tribunal Federal subscreveram
o objetivo petista indicado pelo procurador-geral. O revisor quis a linha
oposta.
Na
argumentação caótica do seu voto, o revisor Ricardo Lewandowski chegou a
exageros de negação patéticos. Apresentar como "documento muito
importante" a comprovação de que o empréstimo avalizado por José Genoino
foi pago, mas silenciando que o pagamento se deu em 2011 e 2012, é de uma
parcialidade gritante. Assim como negar a participação de Marcos Valério no
mesmo aval, apesar da prova documental. E perder-se na invocação, para defender
José Dirceu, de incontáveis depoimentos de petistas, vários deles com
desempenhos grotescos na CPI que investigou o mensalão, foi desfazer da atenção
alheia. Nem isso foi tudo.
No outro
extremo ficam o relator Joaquim Barbosa e os ministros que o têm acompanhado.
Considerar, como fazem, que as votações das reformas previdenciária e
tributária confirmam a "compra" dos recebedores de repasses do PT, é
comprometedor. Os oposicionistas também votaram a favor dos dois projetos,
porque ali estava o PT dando as costas a si mesmo, lutando pelo que sempre
repelira.
No PT, e
não fora dele, foi necessária a ação do comando petista por votos nas reformas.
A ponto de que esse empenho culminasse com a expulsão, por fidelidade à posição
programática do petismo, da senadora Heloísa Helena e dos deputados Luciana
Genro, Babá e João Fontes, logo seguidos pela exoneração voluntária de outros
petistas tradicionais.
Se aquela
é a demonstração mais firme da compra de votos, não é melhor a afirmação de que
José Dirceu mandou o petebista Emerson Palmieri a Lisboa com Marcos Valério, em
viagem para coletar milhões na Portugal Telecom. Tal versão criada por Roberto
Jefferson, chefe de Palmieri, encobre algo importante, que permanece obscuro
porque a Procuradoria-Geral da República preferiu, em vez de abrir uma
investigação específica, beneficiar-se do valor acusatório da versão.
Não há
dúvida de que o julgamento do Processo 470 ficará na história. Por muitos
motivos.
Publicado na Folha de S.Paulo, em 07/10/2012.
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