quinta-feira, 18 de outubro de 2012

"Kit gay" será em 2012 o aborto de 2010

Vera Magalhães
 
O segundo turno da eleição em São Paulo vai reproduzir não apenas a polarização entre PSDB e PT, mas também um dos principais embates da campanha presidencial de 2010: a discussão, puxada por igrejas, de um assunto de cunho comportamental e religioso em plena disputa política.
O papel que teve o debate sobre aborto há dois anos será agora desempenhado pela discussão em torno do chamado "kit gay", material didático que foi encomendado pelo Ministério da Educação sob a gestão de Fernando Haddad com a justificativa de combate à homofobia nas escolas.
O kit foi atacado por várias denominações religiosas, que viram na iniciativa uma forma de incitar a homossexualidade entre crianças e adolescentes.
A polêmica que se seguiu à divulgação do projeto foi enorme e atingiu a bancada evangélica do Congresso, que ameaçou retaliar o governo em votações caso o material não fosse suspenso. Dilma Rousseff mandou suspender o lançamento, e Haddad nega a paternidade da proposta, mas o estrago foi feito.
Usado ainda com parcimônia no primeiro turno, em que o mensalão e a aliança com Paulo Maluf foram os maiores telhados de vidro de Haddad, o "kit gay" volta com força agora, já que uma das estratégias do PSDB será evitar que o petista se beneficie do voto evangélico -na primeira etapa foi depositado majoritariamente em Celso Russomanno.
O material já levou, por exemplo, igrejas evangélicas com peso, como a Assembleia de Deus, a apoiar José Serra. Também deve dificultar a adesão da Igreja Universal do Reino de Deus, braço religioso do PRB de Russomanno. O partido deve se limitar a um apoio protocolar, no campo apenas institucional.
Do lado tucano, os ataques de cunho religioso não deverão nunca ser enunciados por Serra, que em 2010 também evitou ser o responsável por vocalizar a ambiguidade de Dilma Rousseff quanto à descriminalização do aborto.
Serão as igrejas e os aliados do tucano que vão se incumbir de associar o petista ao kit encomendado pelo MEC.
A campanha petista já discute um antídoto para evitar que Haddad fique preso às cordas, na defensiva, respondendo ora sobre mensalão ora sobre "kit gay".
Questionado no debate da Folha/RedeTV! sobre o tema, Haddad mais uma vez procurou se desvincular do kit, mas não foi taxativo ao dizer que não adotará material semelhante na prefeitura, caso eleito. A defesa da diversidade sexual e o combate à intolerância são bandeiras históricas do PT, que têm na ex-prefeita Marta Suplicy uma referência.
Qualquer manifestação do candidato esbarraria nessa convicção petista e poderia afastar outra parcela do eleitorado do ex-ministro, formada por intelectuais e acadêmicos da esquerda.
Ainda assim, apoiadores de Haddad defendem que ele dê uma declaração definitiva e imediata sobre o assunto, dizendo que a prefeitura não levará a discussão anti-homofobia às escolas municipais.
Assim como em 2010, a pauta religiosa está de volta aos palanques.
Publicado na Folha de S.Paulo, em 10/10/2012.

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