Editorial Folha de S.Paulo - 30/10/2012
Qual a
sua religião? Concorda com a decisão do Supremo Tribunal Federal em relação à
interrupção da gravidez de fetos anencéfalos? Como é a sua família?
É difícil
imaginar como, em uma República, perguntas como essas, de estrito caráter
pessoal, poderiam contribuir para selecionar os melhores candidatos em um
concurso para juiz. Porém, questionamentos dessa natureza são costumeiros nos
exames realizados por diversos tribunais brasileiros.
Após
serem habilitados em provas técnicas, os postulantes ao cargo de magistrado são
habitualmente submetidos a uma audiência reservada, na qual enfrentam questões
subjetivas e pessoais. Só então são aprovados --ou não.
A partir
de agora, essa tradição inconveniente terá de ser abandonada. O Conselho
Nacional de Justiça, ao analisar recursos de candidatos reprovados no último
certame do Tribunal de Justiça de São Paulo, considerou que as entrevistas
secretas são ilegais.
O
ministro Carlos Ayres Britto, presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ,
reafirmou que concursos públicos devem primar pela imparcialidade dos
julgadores e pela objetividade dos critérios.
Suponha-se,
por liberalidade, que tais entrevistas não servissem para compor a nota dos
candidatos, como alega o TJ-SP. Ainda assim, seria o caso de perguntar, afinal,
por que elas são feitas.
Alguns
desembargadores defenderam as audiências como meio de conhecer o perfil dos
postulantes e saber se eles, para além da capacidade técnica, têm traços
condizentes com a figura de um juiz. O objetivo seria evitar que na carreira
ingressassem pessoas claramente parciais, por exemplo.
Não é
necessária muita malícia, todavia, para imaginar que as audiências reservadas
dão margem a decisões arbitrárias.
Nem é
preciso comprovar que candidatos tenham, de fato, sido barrados com base no
preconceito --moral, religioso, político-- dos examinadores. A simples
possibilidade de que isso aconteça é razão suficiente para, em nome da
transparência, banir tais entrevistas secretas, como receitou o CNJ.
Deve-se
saudar que aos poucos, embora não sem resistência, o Judiciário esteja
abandonando maneirismos arcaicos e abrindo as janelas para arejar a
instituição.
Publicado na Folha de S.Paulo, em 30/09/2012.
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