José
Paulo Kupfer
Cresceram,
às vésperas da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que decide,
nesta quarta-feira, o novo nível da taxa básica nominal de juros, as apostas em
uma última redução de 0,25 ponto, mesmo com os índices de inflação
pressionados. Mas não há divergências de que, em 7,5% ao ano, como já está, ou
em 7,25%, a que pode chegar na quarta-feira, a trajetória da taxa Selic
encerrará por aqui um longo movimento de baixa, que durou 14 meses.
Importa
mais agora, portanto, avaliar se esse recuo a níveis nominais historicamente
baixos é consistente e quais as chances de que tenha vindo para ficar. O passo
seguinte, caso essa avaliação se confirme, é apurar as eventuais mudanças na
estrutura de funcionamento da economia que, fatalmente, viriam com a queda dos
juros.
Para
muita gente, a ficha ainda não caiu. Não é difícil entender que esteja
demorando para que os impactos de juros reais entre 2% e 3%, em lugar das
costumeiras taxas acima de 10%, sejam incorporados às análises sobre as
perspectivas da economia brasileira. O hábito do uso de juros altos entortou
nosso modo de pensar a economia. Mas é crescente o número dos que já conseguem
pensar fora da velha caixa.
“As
pessoas não se dão conta da relevância dessa mudança estrutural do nível da
taxa de juros”, destacou José Olympio Pereira, presidente do banco de
investimentos Credit Suisse, um dos mais ativos do mercado na intermediação de
fusões, aquisições e lançamento de ações, em entrevista recente ao Estado.
Segundo Pereira, experiente profissional do mercado financeiro, ainda que seja
preciso elevar os juros, a taxa real não deve ultrapassar 4% e “isso faz muita
diferença”.
As
hipóteses com as quais trabalham os principais analistas de conjuntura
corroboram a expectativa de Pereira. Nos modelos de previsão desses analistas,
os juros básicos nominais serão elevados, a partir de meados de 2013, porém de
forma moderada. As apostas, no momento, nunca passam de 8,5% nominais – o que
expressa um taxa real, considerando as previsões para a inflação futura, no
entorno de 3%.
Para
muitos analistas, no entanto, ainda não parece claro que juros mais baixos são,
eles mesmos, elementos que contribuem para uma evolução mais benigna do cenário
macroeconômico. Um exemplo interessante é o da relação dívida pública/PIB e de
seus efeitos sobre as contas públicas.
Nos
próximos anos, em razão da queda dos juros, a relação continuará cadente,
apontando para menos de 30%, em quatro anos. Isso apesar do não cumprimento da
atual meta de superávit primário. As projeções para o resultado fiscal primário
em 2012, de fato, subiram no telhado, reforçando a crença de que os 3,1% do PIB
não serão alcançados – nem mesmo com o desconto dos gastos com o PAC. As
estimativas atuais apontam para um superávit primário inferior a 2,5% do PIB,
em 2012, e de menos ainda, nas vizinhanças de 2%, em 2013.
A “folga
fiscal” com a queda dos juros, propiciada no resultado nominal, que inclui,
além de receitas e despesas correntes, computadas na ótica primária, os gastos
com juros da dívida pública, explica parte da mágica. É ela que permite reduzir
a relação dívida/PIB, mesmo com menor “economia para pagar os juros da dívida”,
que é como se convencionou traduzir “superávit primário” para leigos.
Diante
desse quadro, há quem considere que a nova realidade de juros básicos mais
“normais” abre espaços para reduzir o esforço fiscal sem comprometer a
solvência das contas públicas. Com base nessa nova realidade, um afrouxamento
fiscal, mais do que isso, não necessariamente resultaria em pressões
inflacionárias. O “x” da questão é o uso que venha a ser feito dessa folga
fiscal.
Se, por
exemplo, o governo ampliar e horizontalizar desonerações tributárias redutoras
de custos, o efeito líquido da política fiscal pode até ser desinflacionário.
Já hoje, na verdade, o afrouxamento fiscal, em parte devido à redução da
arrecadação com origem na desaceleração da economia, mostra mudanças na
composição dos gastos, com foco agora mais em redução de custos na economia e
aumento dos investimentos.
Isso pode
significar que, em certas circunstâncias, não basta que a política fiscal seja
expansionista para sobrecarregar a política monetária – e exigir mais doses de
seu principal componente, a taxa de juros. Como sempre em economia, tudo
depende da natureza das coisas e das circunstâncias que a cercam.
Publicado em O Estado de S.Paulo, em 09/10/2012.
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